#01: Por que o sucesso de uma mulher na moda incomoda tanto?
Uma defesa da consistência, da construção de marca e da importância de criticar com responsabilidade. Ou, às vezes, simplesmente se calar.
Desde o desfile da Mondepars, na última quarta-feira, tenho lido e ouvido comentários que ultrapassam qualquer senso crítico ou análise construtiva. Veja bem, não sou crítica de moda e, justamente por isso, não me proponho a fazer julgamentos técnicos. Mas sei analisar, buscar o contexto de uma coleção, interpretá-la à minha maneira e tentar compreender o que a estilista quis comunicar. Existe sempre uma via de mão dupla entre quem cria e quem observa. No meio disso, está a expectativa – essa construção subjetiva que fazemos em torno de algo. Quando ela não se cumpre, será mesmo culpa do outro ou da imagem idealizada que criamos?
Conheci a Sasha no ano passado, por meio do meu querido amigo Antonio, que nos deixou em fevereiro. Assim como ele, ela tem uma delicadeza no jeito de falar, de se mover, de sonhar. Mas por trás dessa suavidade, também percebi uma mulher forte, que batalha diariamente por seu espaço em um mercado que, por vezes, tenta apagar o brilho das mulheres criadoras. Isso é, no mínimo, contraditório, considerando que somos nós, mulheres, a maior parte do público consumidor de moda.
Porque quando uma mulher se coloca na posição em que ela deveria estar, incomoda a todos. O incômodo vem do fato de que ela não está pedindo licença, está apenas ocupando o que já é dela por direito.
Dias antes do desfile, visitei o ateliê da Sasha. Ela me contou que queria olhar para os clássicos, aqueles que já fazem parte do DNA da marca. Alfaiataria precisa, de qualidade impecável. Jeans atemporais, que escapam das tendências passageiras e se tornam peças essenciais no armário por muitos anos. Mais do que roupas, percebi ali respeito, paixão, cuidado com o que se propõe a vestir um corpo, seja ele feminino ou masculino.
Sim, há referências. E sim, podemos enxergar semelhanças com outras marcas. Mas, quando falamos de clássicos, não se pode esperar um blazer com uma melancia quadrada no lugar dos botões apenas para parecer ousado. Clássico é clássico por um motivo. E fazer um bom clássico é raro e valioso. A Mondepars entregou exatamente o que prometeu: consistência, qualidade e visão. Quem esperava algo diferente talvez estivesse mais comprometido com suas próprias projeções do que com a proposta da própria estilista.
Tenho certeza de que a Sasha ainda está se encontrando, como é natural em qualquer processo criativo. Mas também sei que ela sabe exatamente a direção para a qual quer navegar. A marca tem apenas um ano de vida, e ainda há muita história a ser contada.



Sasha e eu viemos de mundos completamente diferentes. Mas isso nunca será motivo para não vibrar com a conquista dela. Porque torcer por ela é torcer pelas mulheres. Pelo nosso espaço. Pela nossa permanência.
O hate e a cobrança que ela vem sofrendo são desproporcionais. Um desrespeito não só a ela, mas ao time inteiro que trabalha ao seu lado. Entenderia se houvesse falta de qualidade, se fosse uma piração conceitual desconectada ou algo que, de fato, ofendesse a moda nacional. Mas não foi. Foram roupas bonitas de olhar e vestir, bem feitas e atemporais que atravessaram a passarela – queiram vocês concordar ou não.
É injusto esperar que uma única mulher resolva tudo sozinha, enquanto muitos ainda passam despercebidos, sem qualquer questionamento sobre seus processos, as condições trabalhistas que oferecem ou o impacto do que produzem.
E um lembrete: ter a consciência de que não somos tão importantes assim pode ser o primeiro passo para olhar o outro com mais empatia e menos julgamento.
Por hoje, essa é a minha reflexão. Sei que ela não vai mudar a vida de ninguém, até porque eu mesma não sou tão importante assim. Mas talvez sirva como um convite para pensarmos com mais cuidado sobre o que estamos consumindo, quem estamos escolhendo escutar e, principalmente, quem queremos ser no futuro. E para além disso, fica o lembrete: ser mulher, ainda hoje, significa ter que lutar todos os dias apenas para existir minimamente em paz.
Pra finalizar, deixo aqui um conselho que aprendi com uma antiga mentora: se não tiver nada bom pra falar, não fale. Lacrar só por lacrar na internet é feio. E mais do que isso é vazio.
Boa semana. Eu volto na próxima.
Ali Santos.
Nós já temos tanta gente duvidando de nós sempre (inclusive nós mesmas), é muito importante apoiar outras mulheres ✨ Estou fazendo um curso de pesquisa de tendências de mercado com uma ambientação só com mulheres e é incrível a troca de ideias e a força que cada uma vê na outra, muito inspirador.
Adorei